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Esta semana, no posto de gasolina onde sempre abasteço minha moto, presenciei a seguinte cena: um motociclista mais experiente tentava convencer outro, visivelmente mais jovem, de que a marca de óleo que ele usava era “a única que prestava” e que o rapaz “estava queimando o motor” com aquela “porcaria” que havia escolhido. A conversa durou uns dez minutos, com argumentos cada vez mais enfáticos sobre viscosidade, proteção e desempenho. O jovem motociclista apenas balançava a cabeça, claramente desconfortável, segurando firme sua lata de óleo original.
Ali, entre as bombas de combustível e o cheiro de gasolina, testemunhei uma pequena tentativa de colonização mental em ação.
José Saramago, esse grande pensador português, capturou perfeitamente essa dinâmica humana quando disse: “Aprendi a não tentar convencer. O trabalho de convencer é uma falta de respeito, uma tentativa de colonização do outro.”
Que frase poderosa, não acham? E que universal também. Porque, sejamos honestos, quantas vezes por dia não somos tanto o motociclista insistente quanto o que segura firme sua escolha, resistindo à invasão de suas decisões?
A colonização disfarçada do dia a dia
Qualquer tipo de colonização é, na verdade, um convencimento para que as pessoas adotem ideias às quais já estamos acostumados. É uma forma sutil de escravidão mental, se me permitem a comparação. Não estou falando apenas daquela colonização dos livros de história, com navios e bandeiras. Estou falando da colonização que acontece na mesa do jantar, na reunião de trabalho, na conversa entre amigos.
Pensem comigo: quantas vezes já presenciaram alguém tentando converter outra pessoa de uma religião para outra? Ou um político tentando convencer que sua ideologia é a única salvação para o país? Esses são exemplos claros dessa “colonização moderna”, que não passa de uma tentativa de desconsiderar completamente a cultura, as crenças e as experiências individuais do outro.
Ao longo de minha trajetória profissional, conheci muitos líderes que forçavam suas ideias sobre os outros como se fossem verdades absolutas. Esse tipo de comportamento revela uma falta de respeito profunda pela diversidade humana e uma tentativa perigosa de homogeneização.
É como se quisessem criar um exército de pessoas que pensam exatamente igual, que reagem da mesma forma, que têm as mesmas opiniões. Mas onde fica a riqueza da diversidade nesse cenário? Onde fica a criatividade que nasce justamente do encontro de ideias diferentes?
Para mim, a verdadeira convivência saudável está na troca de ideias, mas sem essa necessidade doentia de convencer o outro a adotar minha linha de pensamento. O diálogo genuíno deve respeitar as diferenças e focar na criação de um ambiente onde cada pessoa possa expressar sua individualidade sem medo de retaliação.
Aprendi que é muito mais produtivo permitir uma diversidade de métodos e ideias, desde que todos cheguem a resultados semelhantes. Cada pessoa tem sua forma única de resolver problemas, de ver o mundo, de contribuir para um projeto. Por que eu deveria querer que todos fizessem exatamente como eu faço?
O silêncio que fala mais alto
Uma das coisas que aprendi ao longo dos anos foi a prática de evitar discussões impertinentes, especialmente em reuniões. Não é covardia ou falta de opinião – é uma forma de manter a harmonia e facilitar a colaboração genuína.
Quando paramos de tentar convencer a todo custo, criamos espaço para que as melhores ideias possam brotar naturalmente. É impressionante como o silêncio estratégico pode ser mais poderoso que mil argumentos.
Um bom líder, e isso vale para qualquer área da vida, deve ser flexível e respeitar as diferentes abordagens que sua equipe, sua família ou seus amigos podem ter. Não se trata de aceitar qualquer coisa, mas sim de promover um espaço onde a criatividade e a individualidade possam se destacar sem pressões externas.
Além da História, existe a colonização do cotidiano
As implicações dessa “colonização mental” vão muito além do contexto histórico e político que estudamos nos livros. Elas afetam profundamente nossas interações e relações cotidianas. Desde a forma como educamos nossos filhos até a maneira como nos relacionamos com colegas de trabalho.
Quando tentamos convencer alguém de que nossa forma de ver o mundo é a única correta, estamos, em essência, negando a riqueza de sua própria experiência de vida. Estamos dizendo que aquilo que eles aprenderam, sentiram e viveram não tem valor.
Hoje, prefiro a revolução silenciosa do respeito. Prefiro ouvir mais do que falar, entender mais do que julgar, aprender mais do que ensinar. Não é falta de convicção, pelo contrário, é a convicção de que cada pessoa tem algo valioso a contribuir, desde que não tentemos moldá-la à nossa imagem e semelhança.
Pense comigo, Saramago estava certo! Tentar convencer é mesmo uma forma de colonização. E talvez a maior libertação que podemos oferecer ao mundo seja simplesmente permitir que cada pessoa seja autenticamente ela mesma, sem nossas pressões ou expectativas. Afinal, a diversidade não é um problema a ser resolvido, é um diferencial a ser celebrado.