Se tem um propósito, então faz sentido

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Desde os meus vinte e poucos anos, eu sempre quis ter uma terra minha, poder administrar a minha própria fazenda.

De onde vinha essa vontade? Vou contar desde o início…

Meu pai era um homem muito sagaz, à frente do seu tempo, então ele resolveu comprar uma fazenda com o propósito de que eu e meus três irmãos pudéssemos ter um projeto em comum e também para poder avaliar qual dos filhos se interessaria mais pelo desenvolvimento do novo negócio e quais seriam os caminhos escolhidos.

Acredito que essa experiência tenha sido bem interessante para o meu pai, mas não foi para mim.

Por quê?

Porque eu me indispus com os meus irmãos!

Cerca de seis anos depois de sermos presenteados com a referida fazenda, os meus irmãos insistiram que nós precisaríamos comprar uma fazenda melhor e maior para alcançar melhores resultados. Eu argumentei que não achava uma boa ideia, porque seria apenas uma outra fazenda e que o trabalho continuaria árduo e requerendo novos investimentos.

Eles contra-argumentavam que a terra não era boa, muito acidentada, imprópria para a criação de gado, que era o nosso objetivo.  No fim eles acabaram me convencendo que seria mais fácil termos sucesso numa fazenda em Pompéia, próximo à Marília, do que na que tínhamos em Santa Rita do Passa Quatro, apesar de a nova fazenda ficar mais distante de São Paulo.

Lá fomos nós, começamos tudo do zero novamente e devo confessar que a implantação foi até mais fácil do que eu imaginava, mas a operação ficou bem mais complicada e eu resolvi que não queria mais ficar no negócio, principalmente depois que eu descobri que eles estavam pegando dinheiro no Banco do Brasil para custear as operações da fazenda, afinal, o meu pai não estava liberando mais grana para os investimentos pois queria ver os resultados do que já havia investido.

Eu fiz algumas contas e entendi que eles já haviam comprometido metade da fazenda como garantia dos empréstimos. Administrativamente falando, nós estávamos bem enrolados e eu falei “eu não quero isso pra mim, eu tenho muitas responsabilidades, respondo por uma parte considerável da empresa de nossos pais, eu quero cair fora desse negócio, o meu propósito de ter fazenda é outro!”

Eles responderam que não poderiam comprar a minha parte no negócio e nós decidimos vender a fazenda. Fizemos um bom negócio, as dívidas foram quitadas e ainda sobrou um bom capital para novos investimentos.

Quando eu vi a situação em que os meus irmãos estavam investindo na fazenda, percebi logo que os objetivos deles eram diferentes dos meus e fiz um raciocínio rápido: “não quero me manter nesse negócio porque não quero ficar endividado e estou passando muito tempo longe dos meus filhos. Como posso resolver? Vendendo a fazenda, pois dessa forma eu voltarei a ter condições de adquirir uma nova fazenda no futuro e administrá-la do meu jeito. (Coisa que não fiz logo na sequência, porque os meus filhos eram pequenos e eu não dispunha de tempo para mais essa atribuição.)

Apesar de não gostar do jeito como as coisas estavam sendo feitas, eu aprendi muitas coisas importantes nos anos em que participei da administração dessas duas fazendas e acumulei novos conhecimentos que na certa fortaleceram o meu propósito de um dia poder investir em novas terras e fazer o negócio dar certo.

Aliás, a curiosidade para entender como funcionava a administração de uma fazenda começou bem lá atrás, ainda na infância, nas visitas à fazenda do tio Ibsen, que ficava localizada na cidade de Luís Antônio, perto de Ribeirão Preto. Foi lá que foi plantada a semente de querer ser dono da minha terra.

Mais tarde, já na adolescência e com brevê de piloto, a sede de saber mais sobre fazendas só aumentava, principalmente quando viajava para Mato Grosso, onde ficava hospedado na Fazenda Bodoquena, de propriedade de Maurício Verdier, Walter Moreira Salles e Nelson Rockefeller. Foram inúmeras oportunidades de observar cada detalhe de como era administrada, de como o contato com a natureza me fazia bem, de como criar gado poderia ser um negócio rentável. Ficava completamente deslumbrado naquela área de 170 mil alqueires, com a criação de mais de 150 mil cabeças de gado e no momento que eu tivesse a oportunidade de ter a minha fazenda, eu não a perderia por nada, pois já sabia os meus porquês de querer fazer esse tipo de negócio e como fazê-lo dar certo.

Anos depois, eu comprei a parte de meus irmãos na empresa da família, consegui pagar tudo rigorosamente em dia, rentabilizei os negócios e então, com mais tempo disponível, reacendi o propósito de comprar a “minha” fazenda. E assim fiz, com a parceria e apoio da minha esposa Cidinha.

Planejamos muito bem o porquê queríamos ter a fazenda, como faríamos o negócio dar lucro e o que faríamos de diferente para nos destacarmos. E não é que deu certo?

Escrevemos uma história de muitas realizações no segmento da pecuária com a criação de gado Guzerá, que ganhou a grife Ramenzoni e fez a Fazenda Alvorada ser um case de grande sucesso, principalmente por sediar os melhores leilões da raça Guzerá entre os anos 2005 e 2013.

Essa história representa a essência do que no meu entender significa viver com propósito: encontrar um motivo, um porquê exercer um determinado talento para executar alguma coisa e direcioná-lo para a sua realização. Produzir alguma coisa capaz de deixar marcas no mundo e na vida das pessoas.

E não pensem que precisa ser algo mirabolante, fantástico, fora de série, não. São coisas comuns, do dia-a-dia. Você pode ser um professor, um fotógrafo, um cozinheiro, um marceneiro, um comerciante, um industrial, um trabalhador voluntário, o que você quiser e puder ser.

Não interessa se você toca apenas a sua vida, ou da sua família, de uma centena ou um milhão de pessoas. O importante é investir o seu talento e a sua paixão em fazer a diferença. Procurar um “porquê” para te guiar em suas ações e decisões, e o “como” e “o quê” surgirão cheios de sentido na sequência.

Esse “porquê”, meus caros leitores, é o diferencial sutil, porém fundamental, entre “fazer algo com propósito” e “ou ser apenas mais um”.

Qual deles tem sido a sua opção?

 

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