Estudar e Observar

Tempo de leitura: 4 minutos

“Para adquirir conhecimento é preciso estudar, mas para adquirir sabedoria, é preciso observar.”

Marilyn Vos Savant

Essas palavras ecoam em minha mente enquanto observo o mundo pela janela do meu escritório, no 8º andar. Aos 85 anos, posso dizer que passei mais tempo observando do que falando, mais horas contemplando do que escrevendo. E, ironicamente, é agora que decido compartilhar um pouco do que aprendi.

O valor da observação no mundo moderno. Vocês, jovens, correm de um lado para o outro com seus smartphones, tablets, laptops e fones de ouvido. Estudam online, fazem cursos, acumulam diplomas. Conhecimento formal, vocês têm de sobra. Mas sabedoria? Ah, essa é uma moeda rara nos dias de hoje.

Lembro-me de quando era criança, observava meu pai e seus amigos em eventos na nossa chácara. Ele não dizia muito, mas seus olhos… ah, seus olhos falavam volumes. Observava as pessoas passando, os pássaros voando, as nuvens se formando. Foi ele quem me ensinou o valor do silêncio, da observação, e o valor de o observar a andar de moto e tentar fazer igual, até aprender, com apenas 7 anos.

Lições de uma vida de observação. Ao longo dos anos, fiz disso minha arte. Na escola, nas viagens, na universidade, nas incontáveis reuniões, nos passeios de motocicleta com os amigos, nas longas esperas nos aeroportos entre uma conexão e outra. Nos aeroportos, aprendi que há muito a se observar além do óbvio: a linguagem corporal das pessoas, as expressões faciais, as interações entre estranhos.

Nas inúmeras viagens que fiz por esse mundo afora, observei casais se apaixonando e se separando. Vi a alegria nos olhos de quem estava acompanhando entes queridos, a ansiedade de quem estava a caminho do desconhecido, aprendi sobre costumes de vários países, aperfeiçoei idiomas, apreciei malas de cores, estilos variados, bem-conservadas ou bem-detonadas. Presenciei a corrupção sutil de políticos em restaurantes caros e a generosidade anônima de desconhecidos diante de situações inusitadas.

Certa vez, eu fui participar de uma regata internacional na Dinamarca e um amigo muito querido também foi, só que voamos por companhias aéreas diferentes. Adivinha o que aconteceu? A mala do meu amigo extraviou e eu tive que socorrê-lo emprestando algumas peças até que a mala dele encontrasse o destino certo.

Quando a mala chegou, dois dias depois, ele ficou tão feliz que se jogou no chão, próximo ao balcão de embarque e dizia “eu vou morrer aqui!” – e, claro, teve muitos observadores que olhavam sem entender o que estava acontecendo e deviam pensar que ele era louco.

A sabedoria no mundo moderno. E agora, vocês devem estar pensando: “Mas onde que esse velho está querendo chegar, o que ele sabe sobre o mundo moderno?” Bem, deixe-me contar-lhes um segredo: as pessoas não mudaram tanto quanto vocês imaginam. A tecnologia evoluiu, sim. Mas o coração humano? As emoções, os desejos, os medos? Esses permanecem surpreendentemente constantes.

Vi o nascimento da internet, a ascensão das redes sociais, a explosão dos smartphones. E sabe o que mais observei? Pessoas ansiando por conexão, buscando aprovação, temendo a solidão. Exatamente como faziam há 70 anos atrás, só que agora com ferramentas diferentes.

Não estou aqui para menosprezar o conhecimento. Muito pelo contrário, estudo é prioridade número 1. Precisamos aprender tudo o que pudermos nessa vida. Mas não podemos esquecer de levantar os olhos dos livros e das telas de vez em quando. E observar. Verdadeiramente observar.

Observar como o atendente do supermercado sorri, mesmo após horas de trabalho cansativo. Observar como o vizinho cuida de suas plantas com um amor quase paternal. Observar o brilho nos olhos de uma criança ao descobrir algo novo.

A sabedoria não está nos grandes eventos, nas manchetes de jornais ou nos trending topics. Ela está nos detalhes, nas entrelinhas da vida cotidiana. Está no não dito, no quase imperceptível.

Um desafio para o leitor. Então, hoje quero propor um desafio: por uma semana, dediquem tanto tempo à observação quanto dedicam aos seus estudos ou ao seu trabalho. Sentem-se em um banco em algum parque e apenas observem. Entrem em um café e, em vez de puxar o celular, observem as pessoas ao seu redor. Olhem nos olhos de quem fala com você, verdadeiramente olhem. Sem pressa, porque a pressa não tem nenhum valor.

Façam isso, e quem sabe, daqui a 60 ou 70 anos, vocês também estarão sentados, olhando pela janela, com um coração cheio não apenas de conhecimento, mas de uma sabedoria que não pode ser ensinada, apenas vivida e observada.

Lembrem-se: o mundo está cheio de pessoas que gostam de ditar regras, modas e comportamentos. Mas sabe quem têm mais a dizer do que eles? Os observadores silenciosos, aqueles que veem além do óbvio, que entendem o não dito. E talvez, só talvez, você se torne um deles.

Agora, se me dão licença, há um pôr do sol magnífico se formando, e eu não perderia isso por nada neste mundo.

1 comentário


  1. A curiosidade nos encaminha a observação e está incentiva a primeira q nos conduz ao saber. Como gosto do ruído do silêncio q me permite e me leva, pacifica e serenamente, à sabedoria de contemplar.

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