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Há algo de reconfortante em ser lembrado, não é mesmo? Um desejo quase primitivo que nos acompanha desde os primeiros passos nesta vida. Na juventude, quando o rubor da inexperiência ainda tinge nossas faces, ansiamos por ser lembrados pela nossa agilidade em absorver novos conhecimentos, por conquistas que, embora grandiosas aos nossos olhos, são tão efêmeras quanto bolhas de sabão. Queremos ser o centro das atenções, o motivo dos aplausos, a cereja do bolo. Essa necessidade de validação externa é um combustível poderoso que nos impulsiona a aprender e a crescer.
Recordo-me dos primeiros anos escolares, quando, por fazer aniversário em dezembro, era alguns meses mais velho que meus colegas. Eles me enchiam de perguntas, e eu, ah, como adorava responder além do questionado! Era como se cada pergunta fosse um convite para eu seguir em busca de novas histórias.
Nos últimos anos do colégio, meus amigos do Dante Alighieri e eu tínhamos um ritual muito legal: nossas idas ao Pandoro, na Avenida Cidade Jardim, em São Paulo, que chamávamos carinhosamente de “o nosso”. Ali, entre alguns goles de cerveja e minipizzas deliciosas, esticávamos intermináveis rodadas de perguntas e respostas, onde cada um trazia à mesa seu ponto de vista, com a genuína curiosidade da juventude.
Mas foi na vida adulta que comecei a compreender verdadeiramente as palavras do Dalai Lama: “Compartilhe seu conhecimento. É uma das maneiras de atingir a imortalidade”. Foi nesta fase da vida que passei por uma maratona de aprendizados, muitas vezes dolorosos, mas invariavelmente transformadores. As responsabilidades se acumularam, os desafios se tornaram mais complexos e a necessidade de compartilhar se tornou ainda mais premente.
A imortalidade a que se refere o sábio tibetano não é aquela dos filmes de Hollywood, com corpos perfeitos congelados no tempo. É algo muito mais sutil e, paradoxalmente, muito mais poderoso. É a imortalidade do pensamento, das ideias que saltam de mente em mente, atravessando gerações como um rio indomável. É plantar uma árvore sabendo que, mesmo que não vejamos seus frutos, ela continuará a crescer e a oferecer sombra a outros.
E assim, ao longo dos anos, senti crescer dentro de mim a vontade de compartilhar. Talvez seja o peso da gratidão – afinal, a vida foi generosa comigo, presenteando-me com experiências que moldaram minha essência. Ou talvez seja a constatação de que o conhecimento guardado é como um tesouro enterrado: belo, valioso, mas inútil. É como ter um algoritmo capaz de prever o futuro, mas mantê-lo trancado em um servidor, sem permitir que ele beneficie a sociedade.
Um episódio marcante na minha vida adulta ocorreu quando trabalhava na Ramenzoni Chapéus. Havia um livro precioso, encadernado em couro, que narrava a história da empresa fundada por meu avô e seu irmão, Lamberto e Dante Ramenzoni. Quando vendemos a empresa, esse tesouro se perdeu. A dor dessa perda me levou a fazer uma promessa: um dia, eu reconstituiria essa história em um novo livro, ainda mais completo, para compartilhá-la com as gerações futuras.
Essa promessa foi cumprida em 2022, no aniversário de 70 anos da Papirus. A emoção ao abrir aquele livro pela primeira vez foi indescritível. Ali estava a linha do tempo, o fio condutor que ligava o passado ao presente, pronto para inspirar e guiar o futuro. A capa, com uma montagem com vários elementos da história, parecia sussurrar segredos de um tempo distante.
Desde então, busco incessantemente oportunidades para compartilhar o que aprendi. Com filhos, amigos, até com estranhos que cruzam meu caminho. Às vezes são lições complexas, como desvendar os segredos da produção do papel cartão para um leigo, explicando os processos de celulose e reciclagem de forma acessível. Outras vezes, são dicas simples, como andar de moto com segurança na estrada ou aliviar uma dorzinha aqui e ali. Mas sempre, sempre, há esse desejo ardente de deixar um pouco de mim com o outro.
Sonho com um mundo onde todos façam o mesmo. Onde o conhecimento flua livremente, sem as barreiras do ego ou do medo. Um mundo onde cada pessoa seja simultaneamente mestre e aprendiz. Quantas vidas poderiam ser transformadas!
No fim das contas, o que realmente almejamos é ser lembrados por termos feito a diferença. Não pelos bens materiais que acumulamos, mas pelas sementes de conhecimento que plantamos, que continuarão a florescer muito depois de nossa partida. É como um professor que inspira um aluno a seguir sua vocação: o impacto desse ensinamento se propaga por gerações. Lembro-me de um professor de História Geral e do Brasil, Ariosto Giaquinto, que além de me ensinar a importância dos fatos históricos para entender o desenvolvimento da humanidade, me acompanhava na degustação de pizzas maravilhosas. Sua influência foi tão grande que me inspirou a seguir gostando cada vez mais da história de grandes líderes e pensadores.
Talvez seja essa a imortalidade de que fala o Dalai Lama. Não a permanência física, mas a continuidade das ideias. A certeza de que algo de nós viverá nos sorrisos, nas ações e nos pensamentos daqueles que tocamos com nosso saber. É como um artista que cria uma obra que transcende o tempo, inspirando e emocionando pessoas de diferentes culturas e épocas.
Não seria essa uma forma mais generosa de viver? Dar sem esperar retorno, ensinar sem cobrar, compartilhar sem medo de ficar sem. É como se, ao espalhar o que sabemos, nos multiplicássemos em versões melhores de nós mesmos. É o conceito do give back, tão valorizado no mundo dos negócios e do empreendedorismo.
Portanto, da próxima vez que você se pegar guardando uma informação valiosa, considere compartilhá-la. Afinal, aquela pequena dica pode ser a chave para uma solução ainda não imaginada. Pode ser um simples atalho de teclado que economiza horas de trabalho, ou uma técnica de negociação que permite fechar um contrato vantajoso.
Nesse ciclo infinito de dar e receber, talvez possamos todos alcançar um pouco da imortalidade do conhecimento. Não nos anais da história, mas nos corações e mentes daqueles que carregarão nosso legado. É a promessa de que, mesmo após nossa partida, continuaremos a fazer a diferença no mundo.
No fim, talvez seja disso que se trata a vida: ser uma ponte entre o aprendido e o porvir. E nesse ir e vir, descobrir que a verdadeira imortalidade não está em ser eternamente lembrado, mas em ter feito a diferença. Uma diferença que se manifesta em cada vida tocada, em cada mente inspirada, em cada semente de conhecimento plantada e cultivada com carinho. E que essa diferença, por menor que seja, contribua para um mundo melhor para todos.