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Há uma sabedoria antiga que segue através dos tempos, um provérbio árabe que diz: “Nunca justifique. Os amigos não precisam, e os inimigos não acreditam.” Esse pensamento, aparentemente simples, carrega consigo uma profundidade que só a experiência de vida pode realmente revelar.
A armadilha das justificativas constantes. Conheço pessoas que estão sempre prontas para explicar cada uma das suas ações, cada decisão tomada. Parece que sentem a necessidade constante de provar o próprio valor, de mostrar que estão no caminho certo. Se chegam atrasadas a um encontro com amigos, passam minutos elaborando uma explicação detalhada sobre o trânsito, o alarme que não tocou, o café que derramou na roupa. Mal percebem que seus verdadeiros amigos já ficam felizes apenas pelo encontro, independentemente do motivo do atraso.
Experiências na infância e adolescência. Desde muito jovem, comecei a perceber que essas justificativas intermináveis pareciam mais cansativas do que esclarecedoras. Nunca precisei usá-las com os meus inúmeros amigos do Colégio Dante Alighieri, muitos descendentes de famílias sírio-libanesas, italianas, espanholas. Essas amizades foram muito importantes para que eu tivesse uma infância e adolescência de experiências incríveis e enriquecedoras para o meu desenvolvimento pessoal.
Lições da universidade. Foi durante meus estudos universitários de Engenharia Industrial, no Stevens Institute of Technology, a quarta universidade mais antiga dos Estados Unidos, localizada em Hoboken, New Jersey, que essa lição realmente se solidificou. Conheci pessoas de todos os cantos do mundo: cubanos, venezuelanos, bolivianos, mexicanos e italianos – ou melhor, italiana, Antonia, uma colega de turma que era filha do secretário do Papa.
Fiz grandes laços de amizade em questão de semanas e, sabe o que era mais interessante? Ninguém estava interessado em longas explicações sobre quem eu era ou por que fazia as coisas de determinada maneira. As conexões mais genuínas aconteciam quando eu simplesmente era eu mesmo, sem desculpas ou justificativas. Apenas era um brasileiro, filho de italianos.
Amizades que marcam. Lembro-me do primeiro amigo que fiz, John Linn, um jovem chinês mais velho do que eu. Ele já estava há dois anos nos Estados Unidos e me ajudou muito nessa fase de adaptação em outro país, longe da minha família e dos meus inúmeros amigos que deixei aqui. Nós dividíamos o espaço na acomodação do Saint Michael’s College, em Vermont, e através dele comecei a criar um novo ciclo de amigos.
Recordo-me também da época da revolução cubana de Fidel Castro, no ano de 1959. A família de um amigo cubano que estudava na minha classe, que possuía uma fábrica de refrigerante em Cuba e desfrutava de excelente posição financeira, perdeu tudo da noite para o dia. Precisei liderar um movimento entre os outros amigos para que pedíssemos ajuda financeira aos nossos pais, garantindo que ele concluísse seus estudos universitários com nossa turma.
O outro lado da moeda. Por outro lado, também aprendi que existem pessoas que, não importa o quanto você tente explicar, simplesmente não vão querer te entender. São aquelas que interpretam mal cada uma das nossas ações. Às vezes, passamos dias tentando justificar nossas decisões, clarificar mal-entendidos, apenas para perceber que nada do que dissermos será capaz de mudar a opinião já formada.
A arte de viver sem justificativas. É curioso como a vida tem maneiras sutis de nos ensinar. Aos poucos, vamos aprendendo a arte de viver e conviver sem a constante necessidade de justificação. Descobrimos que há uma liberdade incrível em simplesmente ser, em agir de acordo com nossos valores e princípios sem sentir que devemos uma explicação a cada esquina. Conviver não precisa de justificativas.
Isso não significa, é claro, que devemos ser indiferentes ou não nos importar com o que os outros pensam. A empatia e a consideração pelos sentimentos alheios são fundamentais. Mas há uma diferença sutil entre ser atencioso e viver em constante estado de justificativa.
Hoje, quando olho para trás, vejo como esse provérbio árabe se manifesta em tantos aspectos da vida. Nas amizades verdadeiras, há uma compreensão silenciosa, uma aceitação que dispensa palavras. E quanto àqueles que estão determinados a não nos entender ou aceitar, nenhuma quantidade de explicações mudará isso.
A verdadeira sabedoria, talvez, esteja em reconhecer quando as palavras são necessárias e quando o silêncio é a resposta mais eloquente. Em aprender a confiar em si mesmo o suficiente para não sentir que deve explicações constantes ao mundo. E, acima de tudo, em cultivar relações onde você é aceito e amado simplesmente por quem você é, sem necessidade de justificativas ou desculpas.
No fim das contas, talvez o aprendizado mais valioso seja este: viva de forma autêntica, aja com integridade e deixe que suas ações falem por si. Os verdadeiros amigos entenderão, e quanto ao resto? Bem, como diz o provérbio, eles provavelmente não acreditariam de qualquer forma.